Caregivers Portugal

A Caregivers Portugal, Associação Portuguesa de Cuidadores, foi criada com o objetivo principal de representar os cuidadores e cuidadoras, de se bater pela criação de uma carreira profissional que reconheça a especificidade técnica e humanística destes profissionais e lutar por tabelas remuneratórias justas que os retribuam de acordo com as suas elevadas responsabilidades e competências profissionais.

Convém clarificar o que se entende por cuidador pessoal, alguém que ajuda outrem, privado parcial ou totalmente de autonomia, nas suas atividades de vida diária. Os cuidadores podem ser familiares, tipicamente os que cuidam de familiares e não auferem remuneração, ou profissionais remunerados e, dentre estes, os que possuem qualificações específicas, considerados formais, e os que cuidam de alguém sem possuírem qualificações, embora possam ter mais ou menos experiência, designados informais.

É sabido que esta caracterização não gera unanimidade e que há autores que utilizam outros critérios para definir categorias de cuidadores, mas no quadro cada vez mais profissionalizado em que se tem de agir e tendo em consideração a necessidade de clarificar o exercício desta atividade progressivamente a evoluir para uma verdadeira profissão, é esta a nossa aposta e é neste sentido definidor de um novo enquadramento do exercício da atividade de cuidador/a pessoal que a Caregivers Portugal orienta a sua ação.

À semelhança de muitas outras profissões que há décadas exigiam baixos níveis de formação e cujos profissionais eram muito mal remunerados e hoje se impõem a administrações e governos, a profissão de cuidadores pessoais, pela missão que lhes está cometida e pela crescente exigência de quem é objeto de cuidados em ser tratado por profissionais cada vez mais qualificados, tende a transformar-se numa profissão com elevados níveis de qualificações técnicas e humanas, a que terão de corresponder níveis remuneratórios crescentemente elevados.

É esta a realidade que se esconde por detrás de uma aparente anomia relativamente a encarar de frente um problema que não tardará a agitar a opinião pública e a provocar um incalculável impacto em muitas organizações e instituições, bastando apenas que a evolução rápida da situação portuguesa em matéria de cuidados pessoais alcance o nível de exigência que outras sociedades mais desenvolvidas já conhecem para esta questão se tornar imparável.

Quanto aos chamados informais, registe-se que se foge a falar de cuidadores familiares, que serão a maioria, usando-se aqui o condicional por ninguém ter números fiáveis, sendo razão bastante o facto de um setor dos que se debruçam sobre esta matéria entender que se deve desvalorizar o papel da família e reforçar o do Estado.

Para aqueles, a família parece ser uma abencerragem do passado, uma tralha a aguardar reciclagem ou mesmo aterro, não ocorrendo a esses propagandistas das causas sociais fraturantes que se pode não falar até de família, no singular, mas tanto quanto se alcança, é difícil imaginar sociedades sem famílias como já hoje as conhecemos, em que os meus, os teus e os nossos, configuram modelos diferenciadores, nem melhores nem piores, apenas diferentes de um passado mais padronizador.

Acresce que falar em cuidadores familiares diminui o impacto da exigência remuneratória, pois todos aceitam, ou quase todos, para sermos mais rigorosos, que as famílias têm obrigação de cuidar dos seus filhos, dos seus doentes, dos seus idosos, dentro de certos limites, naturalmente, e de acordo com o modelo e condições concretas de desenvolvimento de cada sociedade.

Para a economia do processo importa que o debate se clarifique, se desmistifiquem ideias que não têm qualquer suporte na realidade e se afronte o problema, porque de facto existe um gravíssimo problema social em torno da prestação dos cuidados pessoais, sendo urgente conferir aos cuidadores familiares apoios que lhes são devidos por um Estado Social que nesta matéria falha em toda a linha, reconhecendo também às famílias que não têm meios ou condições para tratar dos seus entes queridos o direito a beneficiarem de apoios que lhes permitam remunerar cuidadores contratados para o efeito, assim se legislando no sentido da criação de um Estatuto dos Cuidados Pessoais Familiares e não dos cuidadores informais.

Esta medida teria amplas repercussões sociais e económicas, tanto mais que constituiria um sinal concreto de que à institucionalização rotineira de quem precisa e de quem é forçado, se estaria a optar por formas financeiramente mais flexíveis e de uma humanidade incomparavelmente superior.

Relativamente aos cuidadores profissionais só se antevê uma solução justa e digna, a criação de um Estatuto de Carreira que enquadre esta atividade profissional, defina as qualificações que os diversos patamares da mesma exigem e os níveis remuneratórios aplicáveis.

Evidentemente que medidas como as que se preconizam, pelos impactos pessoais, sociais e financeiros que determinam, necessitam sempre de períodos de adaptação e de medidas complementares de apoio à adoção de novos padrões organizacionais, mas não se duvida de que o caminho será por aqui e que quanto mais cedo se começar a percorrer, melhor para todos.

A Caregivers Portugal quer ser parceira neste processo, contribuindo para um debate aberto e descomprometido relativamente a ideologias e forças de pressão, alinhado com as melhores práticas internacionais, fomentando a articulação entre o ensino superior, os investigadores e os profissionais e reforçando a massa crítica desta área técnico-científica em desenvolvimento.

José Manuel Silva

Fundador e presidente da Caregivers Portugal